segunda-feira, 21 de julho de 2014

Há razão para a esperança?


“Quando um jovem negro é assassinado na periferia pelas forças do Estado, cabe à mãe chorar e lamentar o injusto epíteto colocado sobre a cova rasa: “Traficante, morto em confronto.” As forças de operação matam, a Polícia Civil qualifica o fato como legítimo, o Ministério Público pede o arquivamento, e o Judiciário sepulta a justiça, arquivando o auto de resistência. A polícia mata na operação, e o aparato jurídico mata a dignidade da vítima com o arquivamento do que deveria ser objeto de apuração”.
 
Quem conhece as instâncias a percorrer até um resultado final de um processo, os atalhos para encerrar uma caminhada processual antecipadamente ou os meandros para postergar um resultado indesejável não tem muito do que se preocupar. Mas a maioria dos cidadãos brasileiros não conhece estes recursos nem tem acesso a eles.
 
Quando um jovem negro é assassinado na periferia pelas forças do Estado, cabe à mãe chorar e lamentar o injusto epíteto colocado sobre a cova rasa: “Traficante, morto em confronto.” As forças de operação matam, a Polícia Civil qualifica o fato como legítimo, o Ministério Público pede o arquivamento, e o Judiciário sepulta a justiça, arquivando o auto de resistência. A polícia mata na operação, e o aparato jurídico mata a dignidade da vítima com o arquivamento do que deveria ser objeto de apuração.
 
Se a vítima não morre, um auto de prisão é lavrado, com grave imputação que será referendada pelas instituições subsequentes. Se o delegado autua um jovem da periferia por formação de quadrilha para o tráfico, ainda que este jamais tenha entrado numa boca de fumo, o Ministério Público certamente o denunciará por este crime, e a Justiça o condenará. A alegação policial, despida de qualquer prova senão as palavras da própria polícia, será suficiente para a condenação. E mais grave, mesmo sem os requisitos específicos para a decretação da prisão preventiva, ela será decretada, ‘para garantia da ordem pública’.
 
A mesma política de referendamento das ‘estórias policiais’ tem sucedido aos manifestantes. Um morador de rua foi condenado a cinco anos de prisão, a pretexto de posse de material para confeccionar coquetel molotov, por portar duas garrafas de plástico contendo água sanitária e detergente com o que desinfetava o local onde dormia. Um militante permaneceu preso por dois meses por associação para a prática de crime. O curioso é que foi preso sozinho. Uma associação dele consigo mesmo.
 
Desde 20 de junho do ano passado, após visita de chefia institucional da polícia a uma delegacia, delegados passaram a homologar as versões dos policiais militares quando da prisão de manifestantes. O que aconteceu naquela visita e a partir dela? A Polícia Civil, ao homologar as arbitrariedades da Policia Militar, demonstra falta de autonomia para conduzir o inquérito policial.
 
Se age em desfavor da sociedade para agradar aos governantes, pode agir da mesma maneira para isentar aqueles que tenham relações não republicanas com os ‘donos do poder’. Foi este tipo de conduta que justificou o pedido de rejeição da PEC 37 e significou um tiro no próprio pé. A ‘pacificação’ das favelas atendeu à especulação imobiliária; a ‘pacificação’ das ruas, aos interesses da Fifa. Ambas com graves violações aos direitos fundamentais e ultraje à Constituição.

 

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