domingo, 19 de outubro de 2014

OAB, Benedito e democracia

"Joaquim Barbosa aposentou-se e requereu inscrição — como advogado — na OAB do DF. Teve seu pedido impugnado.

(...)

“Como cidadão, no entanto, torço para que o Benedito tenha a inscrição negada, tanto na OAB-DF quanto no Conselho Federal da entidade. Isto lhe obrigará constituir um advogado e peticionar junto a um juízo para o controle da ilegalidade. Benedito terá a oportunidade de aprender o quanto os advogados são importantes na defesa dos que têm direitos violados e que nem todos acordam depois das 11 horas. Terá a oportunidade de aprender a diferença entre advocacia e lobby, desfazendo mal-entendidos de sua formação. Terá a oportunidade de aprender que não é a truculência que propicia a vida social, tal como pensa a ‘bancada da bala’, mas o reforçamento dos laços de civilidade. Espero que ele não encontre um juiz com o seu perfil. Em 19 de junho de 2006, um advogado protocolou uma petição de duas laudas para sua apreciação, o que ele nunca fez. Por ter assumido a presidência do STF, a petição foi remetida a outro ministro em 26 de junho de 2013.”

Ex-ministro do STF, Joaquim Benedito Barbosa Gomes aposentou-se e requereu inscrição — como advogado — na OAB do Distrito Federal. Teve seu pedido impugnado. Dispõe a Constituição que é livre o exercício de qualquer trabalho, atendidos os requisitos legais. A lei que regulamenta o exercício da advocacia dispõe sobre requisitos para a inscrição nos quadros da OAB. Inegável que o Benedito preenche os requisitos. Portanto, sua inscrição há de ser deferida. 

A OAB tem a natureza de autarquia. É um tipo de autarquia diferente, ou ‘sui generis’, para quem gosta de latim, porque não está sujeita às mesmas situações que as demais. Presta serviço público, mas não integra a estrutura de nenhum dos poderes do Estado nem a eles está vinculada. 

A inscrição na OAB tem a natureza de ato administrativo e, como tal, não pode ser praticado ao bel-prazer dos administradores. Os atos administrativos hão de ser praticados em obediência aos princípios norteadores da ação do Estado: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Se o Benedito preenche os requisitos de fato e de direito para a obtenção da inscrição como advogado, não se trata de ato discricionário sobre o qual se possa formular juízo de conveniência ou oportunidade para sua edição. Trata-se de ato vinculado de edição obrigatória ante a presença dos requisitos legais. Assim eu decidiria se fosse dirigente da OAB ou juiz chamado a se pronunciar sobre o caso. 

Como cidadão, no entanto, torço para que o Benedito tenha a inscrição negada, tanto na OAB-DF quanto no Conselho Federal da entidade. Isto lhe obrigará constituir um advogado e peticionar junto a um juízo para o controle da ilegalidade. Benedito terá a oportunidade de aprender o quanto os advogados são importantes na defesa dos que têm direitos violados e que nem todos acordam depois das 11 horas. Terá a oportunidade de aprender a diferença entre advocacia e lobby, desfazendo mal-entendidos de sua formação. Terá a oportunidade de aprender que não é a truculência que propicia a vida social, tal como pensa a ‘bancada da bala’, mas o reforçamento dos laços de civilidade. Espero que ele não encontre um juiz com o seu perfil. Em 19 de junho de 2006, um advogado protocolou uma petição de duas laudas para sua apreciação, o que ele nunca fez. Por ter assumido a presidência do STF, a petição foi remetida a outro ministro em 26 de junho de 2013. 

Dia 7, Benedito fez 60 anos. Se a causa ajuizada vier a ser sorteada para um juiz com suas características, pode vir a nunca advogar. Seria uma pena. O ex-ministro perderia a possibilidade de compreender a importância do advogado para a defesa dos direitos, afirmação da cidadania, asseguramento das liberdades, resistência à opressão e aperfeiçoamento da democracia. 


Publicado originariamente no jornal O DIA, em 19/10/2014, pag. E6. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2014-10-18/joao-batista-damasceno-oab-benedito-e-democracia.html


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