“O
saque do FGTS pelos trabalhadores que tiveram suas vidas arruinadas pelo
tsunami da Samarco é antes de tudo medida humanitária que há de ser louvada.
Isto não isenta a empresa de sua responsabilidade”.
A boa-vontade com que a mídia tratou
a Samarco no desastre ambiental que aniquilou a vida em todo o Rio Doce não se
repetiu diante da medida positiva tomada pelo governo federal para minimizar o
sofrimento dos trabalhadores atingidos. Pouco se falou da irresponsabilidade da
empresa que exporta os nossos minerais, como commodities, a preço vil, para nos
vender posteriormente, a preço gordo, os produtos com eles fabricados. Ao
contrário, na primeira semana o noticiário foi sobre os trens da MRS, empresa
transportadora de minério da qual a Vale também faz parte. Foi noticiada a
travessia de pedestres que cruzam as linhas férreas em áreas urbanas, sem
destaque para a falta de sinalização ou funcionário para controle da travessia.
A presidenta Dilma editou o Decreto
8.572, que considera desastre natural o rompimento de barragem, para efeitos do
saque do FGTS. Tão só para este fim. Natural é tudo que ocorre na natureza. O
rompimento de barragem é fato natural, ainda que possa ser causado por conduta
humana a ser apurada e responsabilizada. A Lei 8.036 regulamenta o FGTS e diz
que o valor pode ser sacado pelo trabalhador quando houver necessidade pessoal,
cuja urgência ou gravidade decorra de desastre natural. O saque emergencial do
FGTS para recompor a vida não afasta o direito de cobrar o prejuízo da empresa
causadora do dano.
Uma procuradora do Ministério Público
Federal, em crítica infundada ao decreto, disse que a Samarco poderia usá-lo
para se eximir de sua responsabilidade civil e penal por ter sido considerado
desastre natural. É ignorância ou má-fé. Juridicamente, os bens podem ser
classificados pela sua própria natureza ou por consideração legal. Uma floresta
de eucalipto destinada ao corte futuro é considerada bem móvel por antecipação.
E só para isto. Também não há caso fortuito ou de força maior. Fortuito é o
imprevisível, e força maior é o que, embora previsível, é irresistível. A
erupção de um vulcão, embora previsível, é invencível. Não é o caso de uma
barragem construída por uma mineradora. O evento fora previsto, e era possível
evitar a tragédia.
O saque do FGTS pelos trabalhadores
que tiveram suas vidas arruinadas pelo tsunami da Samarco é antes de tudo
medida humanitária que há de ser louvada. Isto não isenta a empresa de sua
responsabilidade.
Publicado
originariamente no jornal O DIA, em 22/11/215, pag. 18. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2015-11-22/joao-batista-damasceno-samarco-desastre-ambiental-e-fato-natural.html
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