“Há
muito tempo o Brasil é dividido entre ricos e pobres, negros e brancos, zonas
nobres e periferias, doutores e analfabetos, gordos e famintos, herdeiros e
deserdados, latifúndio e sem terra, entre o mundo do capital e o mundo do
trabalho. Não foi dividido agora por quem queria conciliar o inconciliável e
fez vistas grossas até para violações de direitos nas favelas ocupadas
militarmente. É por termos condenado tais violações que havemos de condenar
conduções coercitivas e divulgação de conversas que deveriam ser resguardadas
por imposição legal. Juízes não são deuses. Nem demônios. Sem controle são
capazes das mesmas marginalidades que todos os seres humanos”.
Na mitologia grega, Tânato, divindade
de coração de ferro e entranhas de bronze, personificava a morte. Sem pai, era
filha da noite e neta do Caos. A caveira com manto negro e foice na mão dos
desenhos animados é sua representação milenar. É antagonista da liberdade, do
prazer e da vida.
Nos regimes totalitários do século
20, roupas negras foram adotadas por grupos de extermínio ou forças estatais
especiais comprometidos em promover mortes. Na Itália fascista, foi organizada
a Milícia Voluntária para a Segurança Nacional, transformada em organização
militar. Suas cores forem escolhidas em oposição aos companheiros de Giuseppe
Garibaldi e Anita Garibaldi, os ‘Camisas Vermelhas’, heróis no Brasil e na
Europa. Os uniformes dos ‘Camisas Negras’ italianos foram adotados pelos
nazistas da guarda pessoal de Hitler e pela União Britânica de Fascistas.
No Rio de Janeiro, em 1981, o general
Nilton Cerqueira, que comandava a PM, editou portaria criando um distintivo,
com uma caveira transpassada por um sabre, para ser usado pelos policiais do
Bope, homens de preto que gritam ser a morte pelos becos das favelas. O nome do
general é rememorado quando se fala nas bombas do Riocentro, na morte de
Lamarca e na ‘gratificação faroeste’.
Ao ver o juiz Sérgio Moro com suas
camisas pretas e desejo cego de vingança contra uma classe que se opõe à sua, é
impossível não rememorar tempos de intolerância. Os ânimos estão exaltados e
polarizados. De um lado, cores verde e amarela, usadas por quem — tal como a
UDN — não respeita a vontade expressa nas urnas, e de outro, vestes vermelhas.
Há raiva e morbidez no ar.
Há muito tempo o Brasil é dividido
entre ricos e pobres, negros e brancos, zonas nobres e periferias, doutores e
analfabetos, gordos e famintos, herdeiros e deserdados, latifúndio e sem terra,
entre o mundo do capital e o mundo do trabalho. Não foi dividido agora por quem
queria conciliar o inconciliável e fez vistas grossas até para violações de
direitos nas favelas ocupadas militarmente. É por termos condenado tais violações
que havemos de condenar conduções coercitivas e divulgação de conversas que
deveriam ser resguardadas por imposição legal. Juízes não são deuses. Nem
demônios. Sem controle são capazes das mesmas marginalidades que todos os seres
humanos.
Publicado
originamente no jornal O Dia, em 27/03/2016, pag. 3. Link: http://odia.ig.com.br/opiniao/2016-03-27/joao-batista-damasceno-o-poder-e-a-expressao-da-morte.html
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