“Assim como nas
ruas laterais à Cidade do Vaticano, os logradouros que ladeiam os órgãos
públicos não estão sujeitos à ingerência dos seus 'síndicos'”
A derrocada do Império Romano implicou
o fortalecimento do Bispo de Roma, que assumiu poderes e títulos imperiais,
dentre os quais o de Sumo Pontífice. Para a reunificação da Itália em 1870
foram anexados, em 1861, os Estados Pontifícios, governados pela Igreja
Católica. Em 1929, o fascismo e a Igreja se conciliaram e celebraram o Tratado
de Latrão. Foram reconhecidos reciprocamente o Estado da Itália e o Estado da
Santa Sé, circunscrito à Cidade do Vaticano.
Mesmo as ruas que a ladeiam e compõem o
seu 'perímetro de segurança' estão sujeitas à soberania romana e insuscetíveis
de atuação da guarda do Vaticano. Por outro lado, o Estado Italiano nela não
adentra, e a Justiça italiana recusa julgar crimes praticados no interior do
'Santo Território'.
Em 1943, com o esfacelamento do
fascismo, a Igreja tentou de novo expandir seus domínios. Mas Roma foi ocupada
pelos nazistas, e um general alemão informou ao Papa Pio XII que os limites da
Cidade do Vaticano não seriam violados e pintou uma faixa no entorno da Cidade
do Vaticano.
Um assessor do Papa comentou sobre as
boas intenções do militar e ouviu do Papa que aquilo não era um limite que
impediria a entrada de soldados, mas um limite territorial ao poder da Igreja.
Era limite para quem os queria expandir.
Delimitar zonas de atuação é
fundamental para evitar conflitos. Dispõe a Constituição que ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Aos
particulares é lícito tudo o que a lei não proíbe, assim como estão obrigados a
tudo o que a lei manda. É o Estado de Direito. As ruas, praças, estradas e
praias são bens de uso comum do povo. Nelas todos podem ir e vir. E até ficar.
E, qualquer ordem em contrário, por agente público, caracteriza crime de abuso
de autoridade. Com o interior de prédios públicos é diferente, pois estão
vinculados à sua finalidade e sujeitos ao domínio direto da Administração
Pública.
Assim como nas ruas laterais à Cidade
do Vaticano, os logradouros que ladeiam os órgãos públicos não estão sujeitos à
ingerência dos seus 'síndicos', qualquer ordem para deles se sair é ilegal, o
desatendimento da ordem não é crime de desobediência e ainda caracteriza crime
de abuso de autoridade do agente público que a ordenar. O 'perímetro de
segurança' a ser defendido é o da segurança jurídica constante na Constituição
e que não pode ser violado pelos agentes públicos.
Publicado originariamente no jornal O
DIA, em 07/10/2017, pag. 8. Link: http://odia.ig.com.br/opiniao/2017-10-07/joao-batista-damasceno-perimetro-de-seguranca.html
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